VANTAGENS DA INSEMINAÇÃO ARTIFICIAL

27/07/2011 00:28

 

Fisiologicamente um touro possui a capacidade de realizar diariamente de 3 a 5 coberturas. Contudo, esse ritmo é reduzido consideravelmente ao longo do tempo. Por outro lado, embora o cio das vacas seja repartido de maneira uniforme durante o ano, a concentração de nascimentos em um determinado período é desejável para se beneficiar de melhores preços de mercado da carne ou leite, além de facilitar o manejo das matrizes e bezerros. Geralmente, considera-se que um touro pode satisfazer as necessidades de um grupo de 30 a 50 vacas durante um período de monta de aproximadamente 4 meses. Nessa condição, o touro pode passar de períodos de excessiva atividade sexual a longos períodos improdutivos.

O número de espermatozóides liberado em um ejaculado de touro (aproximadamente 5 bilhões) é muito superior às necessidades da fecundação. Com efeito, esse processo pode ser realizado com eficiência utilizando unicamente três milhões de espermatozóides (às vezes menos) quando colocados diretamente no útero. Na prática, e por medida de segurança, uma dose de sêmen congelado contém aproximadamente 20 milhões. Assim, diluído em um tampão adequado, um único ejaculado fracionado é capaz de fecundar algumas centenas de fêmeas. O sêmen, quando congelado, conserva sua viabilidade indefinidamente, eliminando a necessidade de utilizar o sêmen fresco no período imediatamente posterior à coleta. Isso permite planificar a freqüência de coletas (entre 2 e 6 coletas de sêmen semanais) e otimizar os estoques disponíveis aos produtores. Tecnicamente, é possível armazenar mais de 100.000 doses de sêmen por touro. De forma geral, estoca-se um determinado número de doses (alguns milhares) antes de liberar (ou em determinadas ocasiões sacrificar) o touro que está em processo de avaliação do teste de progênie. Embora alguns touros famosos têm originado uma progênie de mais de 100.000 indivíduos, o número médio de descendentes por touro gira em torno de 6000 a 8000 filho(a)s.

Basicamente, a IA apresenta vantagens decorrentes do melhoramento genético dos rebanhos (incluindo um incremento quantitativo e qualitativo da produção), obtido pelo emprego de touros comprovadamente superiores, do controle de doenças e (embora exista alguma polêmica a respeito) da diminuição dos custos para obtenção de uma prenhez. Uma pequena revisão da relevância desses aspectos pode ajudar a entender o motivo dos ganhos obtidos com o uso da IA, quando bem implementada em sistemas de produção de gado de leite e de corte.

 

. Melhoramento Genético

Desde o início da domesticação dos bovinos, os criadores têm se dedicado a adaptar as características dos animais às suas expectativas (trabalho, produção, docilidade) e ao ambiente. Esta adaptação consiste em substituir regularmente uma parte das fêmeas do rebanho (por motivos de senilidade, baixa produção, doença, morte acidental, etc.) por outras melhores, as quais serão, de forma geral, as filhas das melhores vacas. Num rebanho de corte, por exemplo, 10 a 30% das fêmeas são substituídas a cada ano.

Considerando que a prolificidade da fêmea bovina é baixa (em teoria, uma bezerra a cada dois anos), a possibilidade de selecionar as melhores novilhas por esta via é bastante limitada. Conseqüentemente, o ganho genético depende essencialmente do valor genético dos touros utilizados. Em rebanhos pequenos são procurados reprodutores externos para evitar os efeitos desfavoráveis da derivação genética (perda aleatória das mutações naturais cujo aparecimento incessante permite a evolução das populações) e a consangüinidade.

Torna-se importante, pois, poder comparar com a maior precisão possível, os níveis genéticos dos touros saídos de diferentes rebanhos. Porém, os desvios de desempenho entre rebanhos ou entre indivíduos são principalmente devidos às diferenças do meio de criação (alimentação, patologias, manejo...). A escolha de um reprodutor sobre a base de seu desempenho em um único rebanho apresenta o risco de atribuir à genética uma superioridade devida, na verdade, ao ambiente. Na prática, essa situação ainda prevalece no Brasil, onde o comércio dos touros de monta natural freqüentemente é feito por fazendas (ou criadores) famosas, de boa reputação na sua qualidade técnica para a criação e bom tino comercial, mas de grande incerteza quanto ao nível genético real dos animais vendidos.

Para resolver essa confusão entre efeitos da genética e do ambiente, um dos meios consiste em criar algumas conexões genéticas. Concretamente, isso significa que certos animais (ou seus gametas) sejam utilizados simultaneamente em diferentes rebanhos. Quanto mais esse intercâmbio seja numeroso maior será a qualidade da comparação genética dos animais. A diluição do sêmen permite a difusão simultânea de um número reduzido de touros em um grande número de rebanhos. O congelamento permite utiliza-los durante longo tempo, inclusive muito além da sua morte (a degradação do plástico das palhetas, e não dos gametas, é a causa de perda das doses de sêmen congeladas). Praticamente generalizada desde os anos 70 nos rebanhos leiteiros, a IA constitui uma potente ferramenta de conexão entre os rebanhos. A aceitação do criador em utilizar 30% das IA provenientes de touros em testes de descendência, rigorosamente planificadas, permite aos métodos modernos de indexação estabelecer comparações confiáveis entre animais de rebanhos diferentes. Com isso, o produtor de um rebanho pode escolher o melhor macho, não mais dentro de seu próprio rebanho, mas no conjunto da raça. As chances de encontrar um touro geneticamente superior são assim consideravelmente aumentadas.

Para evitar erros na avaliação da qualidade genética de um macho, são realizados investimentos consideráveis para chegar a uma estimativa (chamada "índice de seleção") tão confiável quanto possível. A seleção sobre a descendência (ou teste de progênie) consiste em medir o desempenho dos descendentes de um touro candidato (repartidos em vários rebanhos) para a (s) característica(s) cujo melhoramento é desejado. O índice de seleção informa sobre a qualidade dos genes transmitidos pelo touro. A conexão entre rebanhos permite eliminar, no cálculo dos índices, os efeitos não genéticos. A precisão obtida, a partir das produções leiteiras controladas de uma quarentena de filhas, é de aproximadamente 70% (coeficiente de determinação = 0,70). À saída do processo, que dura de 6 a 8 anos, os melhores touros testados são colocados em serviço intensivo para inseminação. Sua grande difusão permite amortizar sobre um grande número de inseminações os gastos realizados na avaliação.

Inicialmente, o emprego da IA foi direcionado à industria de gado de leite para permitir que um grande número de vacas fossem inseminadas com o sêmen de um touro com características para melhorar a produção de leite. O impacto do uso da IA pode ser medido pelos resultados alcançados nos EUA. Em um período de 20 anos (1955-1975) a produção individual aumentou de 2.415 para 4.706 litros de leite por vaca. Atualmente, a média de produção ultrapassa 8.500 litros/vaca/lactação. Em termos de fertilidade, a taxa de sucesso (não retorno ao cio após três meses) na primeira inseminação era de 65% em 1965. Esse desempenho da técnica, excelente na época, tem feito poucos progressos desde então, inclusive observa-se um marcado declínio (atualmente varia de 30 a 50%), resultado da fertilidade reduzida das fêmeas submetidas a um maior estresse de produção. O uso da IA, associada a boas práticas de manejo alimentar, tem permitido a alguns rebanhos localizados no Brasil a obtenção de índices produtivos comparáveis aos obtidos nos EUA.

Em gado de corte, além dos objetivos de produção (tais como velocidade de crescimento e qualidade da carcaça dos indivíduos destinados ao abate), tornam-se cada vez mais importantes os critérios de seleção com relação à saúde e ao bem-estar animal. Por exemplo, busca-se selecionar fêmeas com aptidão materna capazes de parir, alimentar e criar seus bezerros sem problemas. Isso implica na seleção de características relacionadas com fertilidade, facilidade ao parto, aptidão ao aleitamento, comportamento materno, etc.

Concluindo, atualmente o processo de melhoramento genético se apóia em uma sólida base científica, que define os objetivos e os critérios de seleção que permitem responder às necessidades do consumidor e do criador. O trabalho do criador consiste em escolher os melhores machos para fecundar suas fêmeas, de forma a produzir novos animais superiores aos pais. Nesse contexto, a IA tira proveito do fabuloso potencial de produção de espermatozóides dos machos e da possibilidade de diluição do sêmen para difundir mais amplamente os melhores touros que respondem aos critérios escolhidos.

 

. Controle de doenças genéticas e adquiridas

Algumas vezes, questiona-se o balanço da IA mencionando os riscos inerentes à difusão massiva dos genes de um pequeno número de reprodutores altamente reputados. Com efeito, a demanda por sêmen chega a ser de aproximadamente 300.000 a 500.000 doses, caso dos 20 melhores touros do mundo da raça Holandesa. Conseqüentemente, qualquer erro na escolha toma rapidamente enormes proporções. Tome-se, como exemplo, o caso do BLAD (Bovine Leucocyte Adhesion Deficiency). Trata-se de uma anomalia genética monofatorial recessiva que induz uma imunodeficiência letal. Ela foi disseminada durante vinte anos a partir de um touro (Osborndale Ivanhoe) nascido nos EUA. Contudo, o problema foi controlado (estima-se que até 2010 essa anomalia estará completamente eliminada dos rebanhos) graças aos testes de DNA aos quais os touros são submetidos antes de entrar nos programas de seleção. Dessa forma, a progressão de eventuais anomalias genéticas pode ser detida até sua total eliminação graças à disponibilidade dessas ferramentas.

A possibilidade de transmissão de outras doenças através da IA é drasticamente reduzida, pois todos os machos destinados à coleta de sêmen são objeto de numerosos e sofisticados testes, fora do alcance do criador comum. A Instrução Normativa SDA (Secretaria da Defesa Agropecuária) Nº 48 de 17 de Junho de 2003 estabelece que "somente poderá ser distribuído no Brasil o sêmen bovino ou bubalino coletado em Centros de Colheita e Processamento de Sêmen, registrados no Ministério da Agricultura Pecuária e Abastecimento, que cumprem os requisitos sanitários mínimos para a produção e comercialização de sêmen bovino e bubalino no país". Antes de ingressarem na central de coleta de sêmen, os reprodutores são submetidos a um período de quarentena, durante a qual são realizados exames sanitários das principais doenças (brucelose, tuberculose, tricomonose, compilobacteriose, leptospirose, diarréia viral bovina) que podem comprometer a reprodução ou a saúde humana. Adicionalmente, exames bacteriológicos e virológicos são realizados no sêmen antes da sua comercialização. Conseqüentemente, diferentemente da monta natural, o uso da IA reduz consideravelmente o risco de transmissão de doenças reprodutivas nos rebanhos.

 

. IA vs monta natural: analise prática e econômica

Um touro explorado, via IA, é evidentemente muito mais oneroso que o touro que cumpre, "livre e solto", com suas "obrigações" em um rebanho. Sua manutenção (cuidadosamente controlada na Central de IA), a coleta, o acondicionamento das doses de sêmen, a distribuição do sêmen e os serviços do inseminador, tornam relativamente elevados os custos. Mas o custo unitário é consideravelmente diminuído devido à repartição sobre um número muito superior de inseminações. Um touro de monta natural possui um custo fixo (manutenção, depreciação) independentemente do número de fêmeas a serem servidas (dentro do limite da sua capacidade fisiológica). Conseqüentemente, o custo da monta natural diminui em função inversa do efetivo das fêmeas do rebanho (Figura 1).

 

Outras vantagens de uso da IA.

Além das vantagens acima mencionadas, a ASBIA relaciona outras situações em que pode ser conveniente (e rentável) o uso da IA.

1 Possibilitar o cruzamento entre raças;

2 Prevenir acidentes, que podem ocorrer com vacas e principalmente com novilhas quando o touro é muito pesado;

3 Prevenir acidentes com funcionários, familiares ou visitantes da propriedade, devido ao comportamento agressivo de alguns touros;

4 Usar de touros com problemas adquiridos e impossibilitados de efetuarem a monta ou após sua morte;

5 Reduzir a dificuldade dos partos, pelo uso de touros que comprovadamente produzem filhos de pequeno porte ao nascimento

6 Aumentar o número de descendentes de um reprodutor;

7 Padronizar o rebanho, facilitando a comercialização dos lotes;

8 Melhorar o controle zootécnico do rebanho.

Inconvenientes do uso da IA

Embora sejam poucos os inconvenientes do uso da IA, muitas vezes a desconsideração desses aspectos pode inviabilizar a implementação de um programa de IA na propriedade.

1 Necessidade de identificar os animais em cio (deve existir uma boa vigilância para detecção do cio).

2 Treinamento para realizar a inseminação.

3 Da mesma forma que a IA promove o melhoramento genético e controle sanitário dos rebanhos, existem o risco (insignificante quando o sêmen é adquirido de centrais registradas) da técnica ser uma poderosa ferramenta para disseminar na população touros de expressão genética negativa ou mesmo doenças reprodutivas.

4 Dificuldade para manter o sêmen armazenado (disponibilidade de N2 líquido).